quarta-feira, maio 31, 2006

CANJA DE CONDELIPAS,OU DE AMEIJOAS,OU DE...berbigões



Estes bivalves,são conhecidos por este nome apenas na região de Lagos.Na época do Marquês de Pombal,esteve durante algum tempo na cidade,o"conde de Lipe",Oficial Alemão que adorava conquilhas,gostava tanto que chegava a mandar os seus soldados para a meia-praia,fazer a apanha deste marisco,que comia desalmadamente.A partir daqui,na cidade de Lagos,ficaram as conquilhas a ser conhecidas pelo nome de:condelipas.

Na minha juventude,deslocava-me frequentemente com amigos,à praia da Fonte da Telha,com o propósito de apanhar conquilhas,nessa zona eram(e penso que ainda são),chamadas de:"cadelinhas"(desconheço a origem do nome).
E lá ía-mos nós,dar ao rabo,para a Fonte da Telha.O Zé Correia(algarvio dos 4 costados),invariávelmente exclamava:PARECE UMA CALÇADA!Na verdade sentiam-se debaixo dos nossos pés,sob a areia,como se de pedrinhas se tratasse.Passado pouco tempo tinhamos um balde cheio de enormes e luzidias cadelinhas que o Zé Correia, mais tarde,abria com presunto,chouriço e mais umas vitualhas de que já não me recordo.
Tempo depois,começaram a capturá-las com "arrastos"puxados por animais(cavalos e mulas),e mais tarde,até com tractores agricolas.Penso que acabaram com a raça das cadelinhas.Ou pelo menos já deve haver muito poucas.

Nós aqui no Algarve,fazemos uma sopa de comer e chorar por mais: Abrem-se as conquilhas ou amêijoas em água.Separam-se as cascas e reserva-se o marisco e a água.
Refoga levemente,cebola picada em azeite,lava um punhado de arroz e salteia no refogado com a cebola,Junta a água quente,resultante da abertura do marisco.Se for insuficiente acrescenta mais água aquecida,cuidado com o sal,não se descuide porque a água de abrir os bivalves já contém sal que estes libertaram ao abrir.Quando o arroz estiver cozido,junta o miolo dos bivalves, coentros picados,e vai rápidamente para a mesa que a sopa é para ser comida assim. Quentinha!

Originalmente era o arroz cozido e no final metiam-se os bivalves para que abrissem,mas como não gosto de cascas no arroz,abro-os primeiro.
É de uma simplicidade extraordinária esta canja,(marisco,cebola,azeite,arroz,água,coentros e sal)e deliciosa. Como estou em regime de contenção de despesas,usei berbigões.Saborosíssimos!

sábado, maio 27, 2006

OSSO BUCO


Para quem pensa que a cozinha Italiana se resume a pizzas e pasta,tem nesta iguaria,a prova de que está muito enganado.Osso buco que em Italiano significa:osso com buraco(é mais ou menos isso),e é uma rodela cortada na zona inferior da perna da vaca.É o chambão com o osso.Classificada como sendo de 2ª,tem um preço relativamente baixo e pessoalmente,é a peça de carne de vaca que mais gosto.Gelatinosa, suculenta e especialmente saborosa.
Embora de origem estrangeira,este prato era famoso num restaurante do Porto,não sei qual e nem sei se ainda existe.

Em Itália há várias formas de o confeccionar,variando de região para região.Aprendi a fazê-lo em Milão,e com algumas pequenas alterações vou transmitir-vos a receita.
Primeiro enfarinhe as rodelas de osso buco e aloure-as em azeite(os Italianos usam margarina)de ambos os lados,com muito cuidado para que o tutano não saia dos ossos,a melhor maneira de os voltar é com uma espátula introduzindo-a entre a carne e o fundo da caçarola.Com a espátula retire as rodelas de osso buco e reserve.
Na mesma gordura que ficou no tacho,refogue cebola,aipo e cenouras(tudo picado)junte tomate(também picado),deixe refogar muito bem até que o tomate amoleça,tempere com sal,pimenta e introduza a carne novamente.Regue com caldo de carne bem quente(um dia destes tenho de postar a receita do caldo de carne)pode usar caldo concentrado,desses que basta dissolver em água a ferver,um pouco de vinho branco e deixe até estar bem cozida(a carne,porque o osso fica sempre rijo.lol!)cerca de 1h30.Em Milão juntam filetes de anchova e alho picado deixando mais,cerca de 30minutos a estufar.Junto apenas os alhos,não gosto do paladar que as anchovas conferem.Rectifique temperos e sirva a carne regada com o molho e polvilhe com raspa de limão e salsa picada.
Gosto muito de acompanhar com tagliatelli,mas também fica bem com arroz,ou batatas fritas se preferir.

Muito cuidado para que a carne não se queime,vá sempre acrescentando água e só no final deixe apurar o molho.

sábado, maio 20, 2006

QUEIJINHOS FRESCOS

A pedido da menina Amélia














Lá estava o Vitorino...volteando o enorme cajado por cima da cabeça,assobiando ordens aos cães,que as cumpriam com obediente celeridade,ora correndo em volta das ovelhas juntando-as numa estridente mistura de latidos e balidos,ora perseguindo e trazendo de volta,alguma mais teimosa que insistia em procurar alguma figueira de folhas tenras e apetitosas.Por cima,um bando de negras andorinhas que evoluíam em graciosas e acrobáticas piruetas,rasando a lã dos animais com uma agilidade surpreendente,só possível em aves deste porte.Explicou-me o pastor,que os animais quando se movimentam no pasto,fazem levantar pequenos insectos(invisíveis para mim)de que as aves se alimentam em pleno voo.Olhando mais atentamente,reparei nos bruscos movimentos que estas efectuavam com a cabeça,para capturar os insectos.
Mesmo junto a nós, imensas cardeiras de cuja flor se extraem os estames(penso que é assim que se diz),que depois de secos servem para coalhar o leite afim de fazer queijo.Era isto que me interessava...os queijos.
Era quase"sol-posto",quando finalmente,depois de uma demorada caminhada entre reluzentes e floridas estevas,cheguei ao "monte"onde habitavam,o Vitorino e a mulher.Ela já tinha fervido o leite,produto da ordenha desse dia(é pra matar os micróbios!dizia-me.O gado tá vacinado,mas isto...nunca se sabe!).Só retiram o leite às ovelhas cujas crias já foram vendidas e,que sem filhotes que as mamem,têm de ser ordenhadas.
De véspera,numa tijela,tinha misturado flor de cardo com água.Agora,coou este líquido através de um pano limpo,espremendo este muito bem com o cardo no interior,afim de extrair totalmente o liquído aí contido,depois juntou-o com o leite já morno e mexeu muito bem com uma colher de pau.Passado algum tempo,(cerca de uma hora),espremeu a coalhada com as mãos,e com uma colher ía retirando o líquido que se formava à superfície,depois"esfarelou",também com as mãos,a coalhada,"é pró quejo ficar mai fino"dizia-me.Depois começou a encher os cinchos calcando a massa com a palma da mão.Após estarem bem cheios alinhou-os muito certinhos numa esteira de cana e depositou-a em cima de uma prateleira,num canto da enorme e fumarenta cozinha.Todos os dias voltará os queijinhos,para que sequem por igual e fiquem bem curadinhos.

Minha mãe,frequentemente faz queijos frescos de leite de vaca.Deu-me a receita,eu fiz e vou reproduzir aqui para vocês:
Comprei dois pacotes de leite gordo,do DIA.Muita atenção,porque tem que ser leite do dia,daquele especial e que tem um prazo de validade muito limitado.O que comprei era Vigor(passe a publicidade).Amornei o leite,se tiverem um termómetro controlem a temperatura e quando atingir os 35 ou 40 graus apaguem o lume.Nunca deve ferver,NUNCA!dissolvi uma pitada de COALHO que comprei na farmácia(pela foto onde se vê o coalho dentro de uma colher de café,podem avaliar a quantidade para os dois litros),num pouquinho de água fria e misturei com o leite,juntei sal e mexi muito bem.Cerca de 40 minutos mais tarde o leite estava coagulado.Passei por um pano bem lavado afim de libertar o queijo da maior parte do líquido(soro) e meti dentro das formas(que improvisei,cortando um pedaço de tubo plástico e uma embalagem de sal vazia)quando comprar queijos pode reaproveitar as forminhas.Quanto mais pressionar o queijo dentro dos moldes,mais duros e compactos estes ficarão.E pronto!não me estou a lembrar de mais nada,apenas vos digo que são deliciosos estes queijinhos.Se não sair bem da primeira vez,tente até que apanhe o jeito.

Na foto das ovelhas,a planta que se encontra em primeiro plano é um cardo,a parte "lilás"é a flor que contém um enzima que provoca a coagulação do leite.
Na primeira foto são visiveis pelo menos três andorinhas,duas recortadas contra o céu,e uma na moita da esquerda.

quarta-feira, maio 17, 2006

GALINHA DO MAR




O nome verdadeiro é TREMELGA,mas é também por galinha do mar que o pessoal aqui da zona o conhece,talvez pela semelhança anatómica das barbatanas com as asas dos galináceos.Enquanto jovem e adepto da caça submarina,tive a oportunidade de capturar vários exemplares desta espécie,cuja principal caracteristica e que muito nos intrigava,era o facto de nos proporcionar algo que muito se assemelhava a um tremendo choque eléctrico.Relembro sempre o meu grande(o melhor)amigo Cintra natural da Cramujeira(Lagoa),infelizmente,precocemente desaparecido num estúpido acidente de viação e companheiro incondicional destas subaquáticas caçadas que nos permitiam passar a pente fino(na maior parte das vezes,apenas como observadores,raramente como caçadores) todo o fundo rochoso existente entre Carvoeiro e Armação de Pera.Existe uma estrada em direcção ao mar,frente à escola internacional de Lagoa,outrora uma azinhaga de areia,ladeada por valados cobertos de figueiras e piteiras,ponteada aqui e ali por pequenas e alvas casinhas de agricultores,hoje asfaltada,servindo enormes e luxuosas moradias de Estrangeiros na sua maior parte.Tomem por essa estrada e irão conhecer uma das mais belas praias do nosso País.A praia da Marinha.Era aqui o nosso pouso preferido.
Este peixe apesar do seu aspecto estranho tem um delicado e fino sabor e é um dos melhores peixes para confecção de caldeiradas.


Em azeite refogue cebola e alho picados,junte tomate picado,pimento,louro,ramo de salsa,vinho branco,sal e deixe apurar bem.Envolva os pedaços de peixe no molho e vá juntando água quente apenas suficiente pera cozinhar o peixe que demora sete ou oito minutos a cozer.Sirva sobre fatias de pão torrado,pode também acompanhar com batatas cozidas.

domingo, maio 14, 2006

FEIJOADA DO TI'CHICO


O Ti'Chico era viúvo e passava os dias na horta que possuía próximo da aldeia.Sempre impecávelmente tratada,ali criava um porquito,2 ovelhas,alguns coelhos e galinhas.
Ainda antes de"romper o sol"já as botas cardadas do Ti'Chico,soavam nas pedras da calçada lisa e luzidia,polida por muitos anos de uso.
Sempre de chapéu preto de aba larga,barba que só via a navalha uma vez por semana,safões castanhos de pele de ovelha,colete cinzento muito coçado,de cuja algibeira emergia uma corrente que voltava a desaparecer na algibeira oposta e que o Ti'Chico puxava de vez em quando,trazendo a reboque um velho relógio que consultava atentamente na palma da mão, a tiracolo um enorme e ruço guarda-chuva,e que fazia também serviço de guarda-sol,dependendo das condições climatéricas.
Um dia,ainda jovem e a pretexto de"caçar"uns peixitos no enorme tanque de rega da horta,fui encontrar o nosso hortelão frigindo cebola picada, alho e rodelas de chouriço em azeite,numa velha panela exteriormente tisnada por muitas labaredas,oriundas de vides retorcidas e raizes de enegrecidas estevas que o Ti'Chico utilizava como combustivel para cozinhar.
Meteu-lhe em cima uma porção de vermelhusco feijão patareco,demolhado da véspera e pra'li esteve mexendo e remexendo com uma colher de pau que ele próprio talhara de um ramo de laranjeira,com a inseparável navalha que sempre o acompanhava no bolso das calças presa ao cinto por uma corrente metálica.
Verteu-lhe uma golada de água que fumegava dentro de um pote de ferro que mantinha permanentemente sobre as brasas,migou-lhe para dentro um enorme tomate madurinho,que eu próprio colhi lá em baixo junto da nora,uma folhita de louro,uma malagueta,e tapou a panela que ficou num exaltado e oloroso borbulhar.De tempos a tempos interrompia os trabalhos agricolas para repôr a água que se ia perdendo por evaporação.
Quando achou que os feijões já estavam macios,juntou-lhe batatas descascadas e partidas em pequenos pedaços(na giria culinária chama-se "corte em camponesa")e tapou novamente com a tampa que parecia ter sido alvo do ataque de algum fanático martelador,de tão amolgada que estava.
Uns minutinhos mais tarde puxou a panelita mais para a beira,onde o calor não era tão intenso,meteu um raminho de hortelã,e abrindo uns pequenos"ninhos"com a colher,depositou aí(depois de partidos) quatro ovos de galinha que ficaram num suave,doce,e quase imperceptivel fervilhar.
"Vocemecê na vai gostar!tá acostumado a comeres finos lá da cidade!"Quando matar um borrego vou convidá-lo p'ra uma caldeirada à minha moda.
O Ti'Chico estava muito enganado,"comeres"finos eram estes!Faço esta feijoada muitas vezes,mas nunca uma que me soubesse tão bem.

domingo, maio 07, 2006

CAVALINHAS ALIMADAS






Se algumas preparações culinárias,oferecem dúvidas quanto á sua origem geográfica,esta é certamente a que maior consenso reune:«O peixe alimado é do Algarve!».
Aqui alimam-se várias espécies de peixe.Sardinhas,raias,charros(atenção!não é aquilo que estão a pensar) é como chamam aqui aos carapaus(corruptela de chicharros).E se pensam que o carapau é o rei dos peixes alimados é porque nunca provaram as cavalinhas.É talvez o peixe mais barato que encontra no mercado.E não é por isso que deixa de ter qualidade,e a sua gordura,assim como a da sardinha,é excelente para quem tem valores elevados de colesterol no sangue.
Existe uma enorme diferença de sabor entre as cavalas pequenas e as cavalas grandes,estas grelhadas são excelentes,mas alimadas,as pequeninas são muito melhores.

Compre cavalinhas frescas,daquelas que nos olham com olhinhos vivos e negros como duas azeitoninhas,pele luzídia e guelras vermelhinhas.
Retire-lhes a cabeça e as visceras e disponha-as num recipiente com bastante sal.Deixe assim durante um ou dois dias.
Depois,passe-as por água para remover o sal,e coza-as em água abundante.Deixe ferver quatro ou cinco minutos,um método eficaz de verificar o ponto de cozedura é,pegar numa das cavalas pela ponta do rabo,se esta se soltar é sinal de que está cozida.Mergulhe as cavalinhas num alguidar com água fria e com os dedos polegar e indicador(um de cada lado do peixe)vá friccionando a pele,assim como quem lima(alima)até que a remova.Ainda com os dedos,separe os filetes da espinha principal e retire as espinhas da zona da barriga.Deixe os filetes de molho em água fria para que percam o excesso de sal,e vá provando ate achar que estão bons.Cerca de meia-hora é suficiente.
Sirva com batatas cozidas,tomate,cebola e pepino.
Num frasco,deite:azeite,vinagre,dentes de alho esmagados com a pele e oregãos.Agite energicamente o frasco para emulsionar o azeite com o vinagre(assemelha-se a uma maionese muito suave e muito liquida.Tempere com este molho e vai ver que é mesmo um excelente petisco.
Faça,e depois tenha a distinta lata de vir para aqui dizer que o peixe está caro.

terça-feira, maio 02, 2006

MASSA OU CALDA DE PIMENTO




Há alguns anos,não existia lar Alentejano ou Algarvio onde não se fabricasse este excelente e delicioso tempero.Primordial na cozinha tradicional destas duas provincias,indispensável no tempero e na conservação das carnes e na confecção dos deliciosos enchidos.
Os pimentos após amadurecerem e tomarem a cor vermelha,eram colhidos,cortados ao meio no sentido longitudinal,e retirados o pé e as sementes.Eram então acamados em caixotes de madeira,uma camada de pimentos e sal,nova camada de pimentos,mais sal,e assim sucessivamente até esgotar os pimentos ou a capacidade da caixa.Depois eram pressionados com algo pesado,normalmente uma prancha de madeira sobre a qual se sobrepunham pedras.Assim ficavam durante dois ou três meses enquanto iam libertando liquidos que escorriam através de frestas existentes no fundo dos caixotes.Findo esse tempo eram moídos e guardados em frascos,era a massa coberta com azeite e os frascos herméticamente fechados.Duravam um ano,normalmente até à próxima colheita de pimentos.

Hoje simplifico esta operação e cozo os pimentos em água,depois de cortados e limpos de sementes.Deixo escorrer bem a água e com uma faca pico-os finamente,metade deste picado passo no triturador,poderia moer tudo e ficar com uma massa fina,mas gosto de ver e sentir os pedacinhos de pimento na comida.Junto vinagre e bastante sal até provar e notar o sabor salgado,isto ajuda na conservação.Meto em frascos,e cubro com uma pequena camada de azeite afim de evitar o aparecimento de bolor.
É conveniente repôr o azeite de cada vez que se retira calda do frasco.
Muita atenção quando se utiliza esta massa na confecção da comida.É preciso lembrar-se que este ingrediente já tem sal.Faça a calda e experimente em pratos de carne ou peixe e vai ver como é deliciosa.

Pode adquirir esta massa em qualquer supermercado,mas faça-a você mesmo e,vai ver a diferença de sabor.